23 de agosto de 2010

Concentraivos irmãos!

A falta de concentração que nos invade às vezes é de morte, não é mesmo? Quando um autor não consegue concatenar as idéias, o melhor tema a versar, é a falta delas. Um pouco clichê, sabemos disso, eu e meu senso crítico, mas acontece que há dias a concentração foi pra lá não sei onde, e então começo me sentir culpada em não dividir nada com meu raro (mas fiel) público.

Me pergunto nesse momento de total falta de inspiração para “cronicar”, o que faz um médico, um engenheiro, um dentista... Não vamos tão longe, um atendente da padaria quando isso lhes acontece?

Imagina a velhinha entrando no consultório do seu geriatra. Começa a tirar da bolsa as diversas bulas de seus remédios favoritos e contar sobre as ultimas aventuras da cadelinha Brigite, seu motivo de alegria nesses empoeirados oitenta e picos anos. O médico então levanta da cadeira, vai até a janela, acende um Malborão vermelho e diz: “Olha Dona Ruth porque a senhora não vai pra casa cuidar da sua vida e para de me encher o saco?” Dona Ruth certamente teria um colapso ali mesmo e então, o médico se veria realmente inspirado a trabalhar.

Ou quem sabe o mestre de obras chegando para o engenheiro responsável pela obra pra falar sobre a viga que está pessimamente colocada. Da salinha secreta, atrás de mesa cheia de plantas a serem consultadas, o pobre pião visse o chefe perdido no fla-flu. Ou o pobre menino apavorado com a boca inchada, no momento de tirar o primeiro siso, e o dentista começasse então a filosofar com aquela infeliz broca na mão. A cada momento em que se aproximasse com o instrumento da boca do menino, recuasse, lembrando do momento em que percebeu que colônias de bactérias são como a sociedade brasileira. “Sempre acham um jeitinho de se reprocriar”.

E pior, imagina, você chegando à padaria da esquina e pedindo um pãozinho francês e o atendente lhe perguntando: “O que você quis dizer com isso?” Você só quer um pão oras, como assim? Mas ele insistiria em lhe perguntar por que essa é a sua opção do dia, e porque não o pão português, que afinal também é deveras saboroso.

A máquina precisa funcionar, mesmo quando nos sentimos vazios, certo? Certo. Mas difícil. Às vezes é mais fácil ser um corpo flutuante do que uma cabeça pensante. E isso acontece com qualquer mortal. Não? Mas é nesse momento, em que precisamos fazer com que as coisas funcionem, que devemos deixar as “seres humanidades” de lado. Focar no que é preciso. Afinal, como ficarão as velhinhas solitárias sem seus queridos Docs para ouvir suas lamúrias cotidianas. Ou, o que serão dos funcionários tarefeiros, sedentos por uma ordem. Ou, o que serão dos pobres clientes, que apenas esperam seu misto quente no balcão, sem querer compartilhar sua opinião às sete da manhã na padaria da esquina. O que será daqueles que buscam na literatura o refúgio para todas essas dúvidas, que nem mesmo a literatura pode aplacar.

Tem dias que é isso mesmo. Apenas estar, o ser fica enfurnado em algum lugar escondido da alma.