2 de maio de 2011

Amar é...


Amar é deixar de comer o bife para dá-lo à pessoa amada.

Amar é, em hipótese alguma tocar Djavan no violão em uma roda de amigos e dedicar à pessoa amada.

Amar é, achar que a pessoa amada é a melhor pessoa do mundo.

Amar é, não rasgar as roupas da pessoa amada. Em hipótese alguma.

Amar é, caminhar quatro quilômetros com uma mochila nas costas sob o sol escaldante, para encontrar a pessoa amada em um acampamento hippie no Vale da Guarda do Embaú.

Amar é ficar com o coração apertado cada vez que se vai passar três dias longe da pessoa amada.

Amar é ter equilíbrio para analisar todas as situações. Salvo: flagrantes.

Amar é querer ser a melhor pessoa do mundo por causa de alguém.

Amar é rezar na igreja para a pessoa amada voltar.

Amar é resignar-se ao próprio amor.

Amar é, manter o romantismo e o erotismo. Mesmo que seja no outro dia de manhã... de ressaca.

Amar é, chorar silenciosamente no banho e depois não saber se é por tristeza ou felicidade - ou apenas por ter um motivo para chorar.

Amar é a despedida demorada... demorada ... demorada ...

Amar é saber compreender quando o outro está cheio de vida e você quer apenas ler um livro.

amar é...

1 de maio de 2011

Ato III - Aliterações de Francisca.

FRANCISCA - Quem sou eu Mariano? Quem sou eu pra lhe dizer alguma coisa...

Quando olho nos teus olhos Mariano, mesmo quando olho nos teus olhos que estão na minha memória, eu sei que não sou ninguém pra te dizer nada.
Eu sou uma vontade. E você sabe isso de mim, o que eu posso dizer, então, que você já não saiba? Nada.

Meu discurso com você é papo furado. É perda de tempo, estou nua diante seus olhos. Cada vez que eu os vejo, mesmo no meu pensamento Mariano, eu estou sempre sem roupas. Tipo aqueles sonhos horríveis sabe? A gente pelado por aí...

Como é que pode uma coisa destas? A gente inventa um domínio, um poder que alguém tem sobre a gente.

Porque, na verdade, Mariano não sabe que exerce esse poder sobre mim. Ele sequer sabe que eu penso nele, que vejo seus olhos com os olhos da minha cabeça. Ele sequer sabe que ele é um homem forte, que ele é corajoso, que ele é bom, muito bom. Mariano não sabe nem dele, coitado. Como vai saber que me domina, que me acalma, que me põe no meu devido lugar.

Eu inventei um Mariano só meu, um Mariano que vive dentro de mim, e que cada vez que eu durmo, dorme comigo, cada vez que eu acordo, acorda comigo, cada vez que eu durmo com outros homens, ele está adormecido, ele é um câncer benigno.
Não me corroi, mas também não sai dali, não vai embora. E me põe ciente de quem eu sou.

Eu talvez quisesse que Marino fosse realmente assim, esse olho dentro de mim, esse ser que me entende, que me percebe nas mínimas nuances do meu humor. Eu talvez quisesse que o Mariano de verdade fosse um ser rarefeito, que ele nunca tivesse existido em minha vida, que ele não fosse mais do que uma visão interna, um suspiro.

Quando eu conheci Mariano eu era uma coisinha me achando tão cheia de graça. Eu andava desvairada por aí. Ele se aproximou, ele se interessou pelo jeito livre que eu tinha. Eu não dava a mínima pra ele, eu estava louca por mim.
Eu humilhei Mariano, eu o desdenhei. Eu achava que ninguém poderia amar mais do que eu já tinha amado.
Ele era tão pequeno, tão frágil, tão doce. Com o tempo ele não desistiu de mim, ele cresceu na minha vida. E eu tirei o sangue dele. Eu deixei casca de ferida na sua pele, eu fui foda com ele.

Ele sobreviveu aos meus piores anos. Tanto que eu tinha pra dizer, tanto que eu queria dizer, tão pequena que eu era. Ele foi quietinho, do meu lado, tornando-se um pequeno homem.

Na medida em que me amou, sofreu. E aprendeu a me fazer sofrer depois. Me devolveu cada centímetro de sacanagem. Cada filha da putice que eu fiz com ele. Me cuspiu na cara todos os meus desvios. Aí, depois de um tempo eu vi que ele estava pronto. Havia se tornado esse olho que tudo me vê, que tudo me condena.

O amor com Mariano foi brando e companheiro. Tudo que a paixão nos tomou, o amor nos devolveu. A calma para pensar a vida apenas como uma sequência de dias que precisam ser vividos um a um, até o fim. Uma noção de liberdade, porque quando o amor nos tranqüilizou, nos tornamos livres um do outro. A urgência e o medo foram embora, e deram lugar a uma certeza de que já fazíamos parte um da vida do outro.

Mas acho que quando a gente ganha tanta certeza assim, a graça acaba. É infantil essa fala? É óbvia, é pensamento masoquista, típico de quem não sabe amar. De quem, na verdade pensa que ama, quando está apenas ganhando o jogo, porque é um jogador nato. Isso, é na real, na real, padrão de solidão..

Um dia Mariano foi embora da minha vida. Eu deixei a porta aberta, literalmente, e ele foi embora. Eu quis despertar as dúvidas, começar um novo jogo. Queria ver se eu tinha mesmo certeza que ele me amava, e vice-versa. Eu abri e depois fechei a porta de Mariano. E dele, eu não sei mais.

Não sei mesmo. Onde ele mora hoje. Como é a nova casa de Mariano, como é o seu novo quarto, sua nova vista. Ele escafedeu. E eu não sinto falta dele. Não sinto? Eu acho que não.

Talvez eu não sinta a falta dele, porque parece que ele ainda está aqui. Com esse olho enorme me cuidando. Um olho comprido, que sabe de mim.
Só que ele nem sonha isso. Se eu pegasse o telefone agora, e digamos, se eu soubesse o telefone dele agora, e ligasse, num ato de “foda-se tô bancando a desequilibrada mesmo” e quisesse saber se ele ainda me amasse eu acho que ele diria “não, acho que não”. Não tenho certeza se ele diria assim. Ele é de poucas palavras, eu acho que ele diria “o que houve?”. Responderia com uma pergunta pra ganhar tempo pra pensar e depois desviar o assunto.

Eu tanto quis que conquistei a dúvida do amor de Mariano.
E agora ele não é mais um homem doce, ele está amargurado, eu consegui fuder com Mariano de vez. No sentido de que ele nunca mais vai amar outra pessoa da forma doce como me amou. Mas ele pode amar de um jeito maduro, mais intenso.
...Eu acho que não odeio esse pensamento, dele amar outra pessoa... É estranho... Que estranho pensar assim...

É, me sinto um pouco culpada em relação a ele, porque eu acho que acreditei tanto que o que havia conquistado com ele era pra sempre, que quando eu não quis mais essa porra de “pra sempre”, senti uma baita culpa.
Porque eu fiz e aconteci com ele. Depois foi ele quem fudeu comigo, cagou na minha cabeça, aí, empatados, resolvemos hastear a bandeira branca do amor.
E aí... Eu desisti. Ou não. Talvez eu só tive mais coragem.

Não sei ao certo, só acho que eu quis pular fora, como se tivesse sonâmbula no meio da noite, e inconsciente, apenas estivesse buscando um copo d’água.

Eu aprendi a gritar comigo mesma, de não ter que precisar de Mariano para gritar. Ter Mariano dentro de mim não é um conforto, é algo que simplesmente está.  Talvez perdure, até quem sabe Mariano já estar completamente de olhos fechado para mim, e eu, olhando em outra direção.
Brega essa última frase, é eu acho brega na real. Gostaria de saber usar mais metáfora, metalinguagem. Mas eu não consigo.